Oito anos se passaram desde que Luciano Martins me convidou ao seu ateliê da Lagoa da Conceição e me disse que decidira definitivamente optar pela pintura. Assim, abandonaria ( pelo menos em princípio, como então pensei ) a carreira publicitária de sucesso que tinha construído em tão pouco tempo. Confesso que, sendo eu também um artista, e bem mais velho do que ele, me coloquei em seu lugar para refletir sobre aquela “absurdidade”. Naqueles dias – como nos de hoje – sempre se soube que arte e dinheiro, nunca andaram de mãos dadas. São condutores de dois trilhos de uma estrada de ferro que nunca se encontram. E artistas não se alimentam do vento. Precisam ganhar a vida, embora isso não pareça real a muita gente. Mas como eu escrevi sobre Luciano naquela época, ele tinha pressa. Pressa em construir uma carreira sobre o que acreditava: seu talento, sua luz e sua disciplina. De seu talento e luz sempre se soube. Basta ver os belos e lúdicos trabalhos que hoje compõem uma marca registrada. Quanto à disciplina de Luciano, esta firmou-se como a grata surpresa que o fez diferente de todos os artistas que já conheci. Resoluto, traçou um plano de vida profissional, continuando a produzir a leveza de uma obra singular e, ao contrário do que se possa pensar, muito difícil de ser sustentada a não ser pela manutenção da insistência em divulgá-la de maneira global. Usou seus sólidos conhecimentos fundados na publicidade. Optou pela reverberação da imagem de seus quadros através de produtos de consumo – algo impensável para muitos críticos ( e muitos artistas ) que por definição desejam encontrar no hermetismo da obra o único discurso verdadeiro sobre a arte. Obras de arte deveriam ser feitas para o consumo geral, e não para a fruição privilegiada de alguns. É justamente o contrário desta assertiva que ainda insiste no mundo contemporâneo em construir em torno da arte um mito elitista de conotações pretensamente eruditas, de uma arte que deva ser interpretada. Susan Sontag escreveu um clássico intitulado “Não à Interpretação”. Sem querer tornar reducionista os elementos contidos nesta obra magna da literatura, pode-se deduzir que, se “todo o artista deve ir aonde o povo está”, Luciano faz cumprir a regra, ainda mais nos dias turbulentos em que o fazer artístico alivia as tensões violentas e impregnadas de ódio, como as que se assistiram no ataque fundamentalista aos cartunistas do Hebdo Charlie. Os produtos que levam a marca de Luciano Martins estão nas sandálias, nos canecos, nas embalagens, mas, sobretudo, na absorção e distribuição de uma linguagem lúdica que insiste em somar-se ao – para não se dizer tomar de todo – o lugar por vezes sisudo das galerias e dos museus. Há ainda mais em Luciano: o artista voluntariou-se nos domínios da benemerência emprestando sua assinatura a entidades necessitadas de ajuda, o que, pela natureza de seu trabalho, tem alcançado muitos resultados práticos e inquestionáveis em utilidade e importância. Passados esses anos desde o primeiro texto que escrevi sobre Luciano Martins, visitei o seu site onde pude comprovar o coroamento de uma carreira e aliviar o frio que me passou pela espinha durante aquele encontro em seu ateliê da Lagoa. O artista, que ora completa 15 anos de profícua atividade, apresenta uma primeira retrospectiva de sua obra consolidada e respeitável sob todos os aspectos: forma e conteúdo,  comunicação ao alcance de todos os públicos e generosa circulação no mercado; enfim, uma obra verdadeiramente democrática.

 

 

Paulo C. Amaral
Artista plástico, Curador de artes
Membro da ACADEMIA BRASILEIRA DE BELAS ARTES, RJ